As novas regras do governo federal para a concessão de ex-tarifários — incentivo fiscal de redução temporária ou isenção do Imposto de Importação sobre itens sem produção em território brasileiro — tendem a causar redução do número de incentivos concedidos para bens de capital (usados na produção de outros bens) e bens de informática e telecomunicações. A avaliação é de especialistas, que veem como possível consequência custos maiores para empresas que importam e aumento de preços ao consumidor no caso de bens de telecomunicação e informática.
O governo, por sua vez, admite que o número de ex-tarifários concedidos deve cair, mas nega a possibilidade de elevação de preços. Segundo o secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC), Márcio Elias Rosa, as mudanças corrigem uma concessão “excessiva” de ex-tarifários e valorizam a indústria nacional.
As mudanças na política de ex-tarifários constam na Resolução 512/2023, do Comitê Gestor da Câmara de Comércio Exterior (Gecex) do MDIC. A norma abrange ex-tarifários BK (bens de capital) e BIT (bens de informática e telecomunicações), conforme a nomenclatura do Mercosul. A resolução foi publicada no último dia 18 de agosto no Diário Oficial da União.
Uma das alterações é a vedação à concessão de ex-tarifários para itens usados ou bens de consumo (produtos consumidos por indivíduos ou famílias). Além disso, passou a ser obrigatória a apresentação de um projeto de investimento detalhado ao pleitear o incentivo.
A Resolução 512 ainda torna mais fácil comprovar que um item importado possui similar nacional. Antes, para que o bem produzido no Brasil fosse considerado similar era preciso cumprir requisitos como preço, prazo de entrega e desempenho e produtividade iguais ou superiores ao do bem importado. Agora, basta que o produto execute as funções essenciais do item estrangeiro candidato a ex-tarifário. Como a condição para o incentivo é a ausência de similar nacional, advogados avaliam que essa flexibilização deve diminuir o número de itens beneficiados por ex-tarifários.
Segundo Pedro Bini, gestor da consultoria tributária do Schneider, Pugliese, é importante lembrar que a nova resolução busca beneficiar a indústria nacional. “Este é o princípio formador, a tônica da resolução. É uma decisão política de privilegiar a indústria nacional, sem minar a aquisição de bens de capital e tecnologia que precisam ser importados”, afirma.
Bini observa que, muitas vezes, a indústria brasileira tem dificuldades de competir com produtos vindos do exterior não devido à falta de competência, mas pelo tempo de operação menor. “Temos empresas europeias com muita tecnologia e anos de experiência e uma indústria nacional nascente”, destaca.
Porém, para ele, as alterações na política de ex-tarifários podem impactar custos e preços da própria indústria. Uma vez que a tendência esperada é a redução na quantidade de itens beneficiados por ex-tarifários – devido tanto às exigências adicionais para a concessão quanto à flexibilização do conceito do similar nacional – o advogado diz que é preciso aguardar para ver como o setor vai reagir à medida.
“É preciso observar como a indústria nacional vai se comportar, se continuará importando [ainda que os itens sejam onerados] ou se vai optar pela aquisição do similar nacional”, comenta. Segundo Bini, os ex-tarifários equivalem a um mecanismo de formação de preços.
“Eu vejo [como impacto] primeiro a questão da formação de preços e só em seguida uma eventual crise de demanda”, avalia. O advogado acredita, no entanto, que o governo levará em conta um eventual risco de desabastecimento em suas decisões. Assim, vê essa possibilidade como remota, embora não descartada.
“Existe o risco concreto de o governo julgar que existe um produto [similar] nacional e a indústria achar que aquele produto não executa as funções essenciais [do importado]. Você forma esse gap que pode impactar algumas aquisições e isso leva a um risco de desabastecimento”, diz.
Para advogados, a vedação à concessão de ex-tarifários para bens usados também pode impactar a indústria, mais especificamente as multinacionais.
“A maioria dos grandes importadores que se utilizam dos ex-tarifários são multinacionais, cujas matrizes e coligadas estão em outros países. Uma montadora, por exemplo, vai abrir uma nova linha de produção de um carro específico. Ela tem na matriz nos EUA, na Europa, uma linha de produção que já produz esse carro. O que ela faz é pegar essa linha de produção, pleitear o ex-tarifário [para as máquinas e equipamentos] e trazer a linha de produção para o Brasil”, explica Yuna Yamazaki, sócia da área de direito aduaneiro do Lira Advogados. Com a impossibilidade de pleitear ex-tarifários para bens usados, segundo a advogada, essas importações devem ficar mais caras.